É o biopolímero mais abundante do nosso planeta e está presente desde o início da nossa existência. Porém, foi apenas em 1838 que a molécula da celulose foi descrita, por Anselme Payen, químico francês responsável pela descoberta deste constituinte básico das células vegetais.
Atualmente, as aplicações da celulose são muito diversas, desde as mais tradicionais, como a utilização no papel ou cartão, às emergentes. Neste segundo grupo incluem-se aplicações que estão a ser desenvolvidas a nível laboratorial e académico e também no contexto específico do laboratório AlmaScience, sob a direção técnico-científica de Luis Pereira, e outras, a nível industrial, que se encontram mais próximas de poderem vir a traduzir-se em produtos disponíveis no mercado.
A celulose é um material multifuncional que é considerado crucial na transição para uma economia “verde”. Por ser possível alterar quimicamente as fibras de celulose, é também possível criar fibras com diferentes dimensões, a uma nanoescala, originando nanofibras ou nanocelulose.
Aplicações da celulose começaram há vários milénios
A principal aplicação das fibras de celulose continua a ser o papel e o cartão. Essa utilização remonta a 2500 antes de Cristo, com o fabrico de substratos para escrita à base de fibras de celulose, como é o caso do papiro, usado pelos egípcios.
Em termos de mercado global de pasta e papel, em 2021, o fabrico de papel e cartão ascendia cerca de 350 mil milhões de euros.
Fibras têxteis
Trata-se, igualmente, de uma aplicação milenar das fibras de celulose que nos faz recuar mais de seis mil anos até à civilização Inca, que já produzia vestuário de algodão através da extração de fibras de celulose desta planta. Mais recente é o fabrico de fibras têxteis a partir de fibras de celulose regeneradas e consoante o processo de transformação – sistemas de solventes e banhos de regeneração -, podem tomar várias denominações, como viscose e lyocell, entre outras. Estas fibras regeneradas apresentam uma vantagem: é possível controlar a sua dimensão, pureza e até a sua estrutura e morfologia.
Em 2022, o valor do mercado global dos têxteis foi de cerca de mil milhões de euros, em que as fibras regeneradas representavam 18 mil milhões de euros.
Aplicação em compósitos
Os compósitos são um exemplo de aplicações da celulose em áreas emergentes: uma mistura de materiais com funções complementares. O material matriz vai conferir estrutura ao compósito, enquanto o reforço assegura a resistência mecânica da peça. Quando sujeitas a carbonização, as fibras de celulose, juntamente com a lenhina, podem ser precursoras de fibras de carbono e ser utilizadas em compósitos, como bioplásticos.
Na medicina
Os derivados de celulose são já usados em medicamentos, nomeadamente como agentes espessantes, ligantes ou em cápsulas de fármacos. As aplicações emergentes focam-se na medicina regenerativa: biossensores, moldes para crescimento celular e regeneração de tecidos são alguns exemplos. A celulose é também utilizada em vários testes de diagnóstico (um exemplo são os testes rápidos utilizados para diagnóstico da COVID-19), e está em investigação a criação de meios de cultura híbridos de papel/hidrogel de celulose para substituir os meios de cultura standard.
Celulose na eletrónica
As fibras de celulose podem ser modificadas quimicamente para que o papel se torne condutor iónico e seja usado em transístores, para processar informação. A celulose pode igualmente ser dissolvida e regenerada na forma de membranas condutoras iónicas. “A vantagem de utilizar estes materiais na eletrónica passa por permitir reciclar estes dispositivos”, aponta Luis Pereira. Outro benefício é poderem imprimir-se estes dispositivos eletrónicos, usando derivados de celulose como agentes espessantes e ligantes nas tintas para impressão.
Aplicações da celulose no âmbito da energia
Existe interesse, de acordo com Luis Pereira, em utilizar separadores de condensadores de celulose em baterias (por exemplo, de veículos elétricos), em substituição de matérias-primas críticas. Esses separadores de condensadores, que permitem que os dois elétrodos se mantenham separados e não entrem em curto-circuito são, atualmente, feitos com material de origem fóssil. Como sublinha Luis Pereira, “a incorporação de materiais de origem natural, biodegradável em baterias é, obviamente, algo que tem muito interesse.”
Outra aplicação da celulose no sector da energia, que se encontra ainda em investigação, reside no potencial das estruturas porosas geradas na formação de papel, as quais podem ser exploradas para funcionalização, através de um polímero condutor, criando uma estrutura de conversão de energia mecânica em energia elétrica.